Em sistemas sanitários e de bioprocesso, a superfície interna do tubo é mais do que um detalhe estético. Ela é a fronteira física entre o produto e a contaminação.
Por isso, a ASME BPE estabelece os critérios mais rigorosos do mundo para definir o que é — ou não — aceitável em uma tubulação de processo higiênica.
Este artigo apresenta, de forma direta e técnica, os requisitos de acabamento superficial e descontinuidades permitidas pela norma.
Por que os critérios de aceitação importam
A condição da superfície interna é determinante para evitar retenção de produto, formação de incrustações e desenvolvimento de biofilmes. Além disso, influencia diretamente:
- a eficiência de limpeza CIP/SIP,
- a repetibilidade de medições de rugosidade (Ra),
- e o atendimento a requisitos regulatórios em ambientes sanitários e farmacêuticos.
Mesmo defeitos mínimos — muitas vezes invisíveis a olho nu — podem comprometer a sanitariedade do sistema e a estabilidade microbiológica do processo.
Acabamento superficial e rugosidade (Ra)
A ASME BPE define classes de acabamento superficial chamadas SF (Surface Finish), que especificam limites de rugosidade medidos em micrômetros:
| Designação | Ra Máx (µm) | Observação |
|---|---|---|
| SF0 | Não especificado | Áreas não críticas |
| SF1 | 0,51 µm | Acabamento sanitário padrão |
| SF2 | 0,38 µm | Acabamento fino para aplicações críticas |
| SF3 | 0,76 µm | Apenas por acordo entre as partes |
Em aplicações de bioprocesso, SF1 e SF2 são os acabamentos mais utilizados.
Imagem cedia pela EAI Engenharia e Aço Inox – Hortolândia, SP
Condição de superfície exigida
A superfície de contato com o processo deve ser obtida por métodos controlados (polimento mecânico, retífica, usinagem) e estar livre de:
- resíduos,
- óleo e graxa,
- partículas soltas,
- óxidos térmicos (heat tint),
- e contaminação férrica.
A norma permite variações de brilho, desde que a rugosidade permaneça dentro dos valores especificados.
Porém, há um ponto essencial:
A ASME BPE proíbe acabamento espelhado
O texto normativo afirma:
“Buffing to produce a high gloss or mirror finish is unacceptable as a final surface finish on any process contact surface.”
Um acabamento espelhado, embora visualmente atraente, não é considerado sanitário porque:
- mascara microdefeitos,
- torna riscos e pites invisíveis,
- prejudica a inspeção,
- dificulta medições confiáveis de Ra,
- e pode comprometer validações de limpeza.
Brilho não é sinônimo de higiene — e, na ASME, brilho demais é um sinal de alerta.
Inspeção visual e tátil segundo a ASME BPE
A avaliação das superfícies de contato deve seguir os seguintes princípios:
- ser realizada sob iluminação equivalente a 1000 lux (conforme BPVC Section V);
- ocorrer com a superfície seca, limpa e desengraxada;
- ser feita a olho nu, sem ampliação;
- pode ser realizada com boroscópio, câmera ou espelho, desde que sem aumento de imagem;
- pode incluir inspeção tátil em áreas acessíveis.
O objetivo é garantir que falhas reais não sejam mascaradas por iluminação inadequada, contaminação superficial ou superfícies excessivamente polidas.
Imagem cedida por EAI Engenharia e Aço Inox – Hortolândia, SP
Critérios de aceitação da ASME BPE para tubos mecanicamente polidos
A tabela a seguir resume os requisitos oficiais para superfícies metálicas de contato com o processo:
| Descontinuidade / Condição | Critério ASME BPE |
|---|---|
| Pites | Aceitáveis se < 0,51 mm e fundo brilhante. |
| Agrupamento de pites | Máx. 5 pites em 13 mm × 13 mm. |
| Amassamentos | Não aceitáveis. |
| Marcas de acabamento | Aceitas se atendem ao Ra. |
| Riscos – Tubos | Profundidade < 0,008 mm; transversais ao fluxo não aceitos. |
| Riscos – Conexões/Válvulas | ≤ 0,08 mm de profundidade e ≤ 76 mm de extensão. |
| Solda interna | Deve ser nivelada; concavidade só se dentro do Ra; convexidade proibida. |
| Entalhes | Não aceitáveis. |
| Trincas | Não aceitáveis. |
| Inclusões superficiais | Não aceitáveis. |
| Resíduos superficiais | Devem ser removidos. |
| Escória de solda – Tubos | Máx. 3 pites por 6,1 m. |
| Escória – Conexões/Vasos | Não aceitável. |
| Porosidade aberta | Não aceitável. |
| Descoloração térmica | Deve ser removida por decapagem/passivação. |
| Rugosidade Ra | SF1 ou SF2, conforme especificação. |
Conclusão
A ASME BPE estabelece critérios objetivos para definir quando uma superfície é realmente sanitária: controle da rugosidade, ausência de descontinuidades críticas, soldas internas niveladas, limpeza adequada e inspeção em condições padronizadas.
E, acima de tudo:
superfícies espelhadas não são aceitas — porque escondem riscos, pites, inclusões e defeitos que comprometem o desempenho sanitário.
A integridade de um tubo sanitário não está no brilho, mas na capacidade de manter a superfície limpa, inspecionável e controlada ao longo de toda sua vida útil no processo
Posts Relacionados
Tubos Sanitários para Bioprocesso: A mais completa análise entre normas de fabricação e dimensionais
Autor
